Proteção e combate a incêndio
Legislação é ineficaz
O incêndio que atingiu o Museu da Língua Portuguesa, no prédio histórico da Estação da Luz, nesta segunda-feira (21), no centro da cidade de São Paulo, poderia ter sido evitado se a legislação brasileira fosse mais efetiva no que diz respeito à proteção contra incêndio de edifícios tombados pelo patrimônio histórico e considerados patrimônio cultural. A constatação é feita por especialistas a partir da análise das melhores práticas adotadas em outros países, como Estados Unidos, Reino Unido e Canadá.
Tradicionalmente, a regulamentação de incêndios no Brasil tem como objetivo fundamental permitir a saída segura dos ocupantes da edificação durante o incêndio, sendo que a proteção da estrutura e do conteúdo da edificação são tratados como objetivos secundários. No caso de museus e outras edificações do patrimônio histórico, a proteção da edificação e do conteúdo deveriam ser também consideradas fundamentais por tratar-se de acervo, muitas vezes, insubstituível ou edificações únicas que não podem ser reconstruídas.
Em todo o mundo, um número cada vez maior de museus está instalando sistemas de sprinklers ou chuveiros automáticos. Eles são considerados o meio mais eficiente de proteger coleções de obras de arte do fogo por algumas das principais organizações culturais do mundo, como o Instituto Smithsonian em Washington, nos EUA; o Conselho para Museus, Arquivos Históricos e Bibliotecas do Reino Unido; e o Instituto Canadense de Conservação do Patrimônio.
“O incêndio não é uma fatalidade. Quase todos os incêndios podem ser evitados, desde que sejam instalados sistemas de proteção adequados, e que estes sejam mantidos e inspecionados periodicamente”, explica Marcelo Lima, diretor geral do Instituto Sprinkler Brasil (ISB), organização sem fins lucrativos que trabalha no Brasil pela melhoria do ambiente regulatório, com o objetivo de promover a prevenção eficaz contra incêndio em prédios comerciais, industriais e históricos, por meio de sistemas de sprinklers.
No caso dos museus, os sistemas de sprinklers são os equipamentos de segurança mais eficientes para proteger estes locais, na medida em que são acionados individualmente pelo calor do fogo para combater o foco do incêndio e porque utilizam baixa pressão de água, o que reduz o dano às obras de arte.
De acordo com documento publicado pelo Instituto Canadense de Conservação do Patrimônio em 1998, os mitos que fazem com que os responsáveis por museus temam os potenciais danos provocados pela água dos sistemas de sprinklers estão gradualmente caindo por terra. Contrariamente à noção de que os chuveiros automáticos são ativados todos de única vez, eles são abertos um a um e, geralmente, entre um a três chuveiros são suficientes para acabar com o fogo. Eles são ativados pelo calor e não pela fumaça, exigindo uma temperatura entre 57º e 77ºC para começar a funcionar.
Além disso, o documento explica que a água dos sprinklers causa menos dano do que a água das mangueiras do Corpo de Bombeiros. Isso porque os chuveiros automáticos liberam água a uma vazão de 110 litros por minuto no local do início do incêndio, enquanto as mangueiras do Corpo de Bombeiros despejam uma quantidade dez vezes maior, com alta pressão em toda a região do incêndio, muitas vezes danificando mais obras de arte.
“Temos acompanhado uma sequência de incêndios em prédios históricos no Brasil, como o Teatro Cultura Artística, o Memorial da América Latina e agora o Museu da Língua Portuguesa. Na ocasião do incêndio, os responsáveis por estes lugares afirmam estar cumprindo com o que está previsto na legislação, mas, se o prédio pega fogo é porque o nível de proteção adotado não é suficiente para impedir que eles queimem”, constata Lima.
Há casos como o do Memorial da América Latina, que tinha sprinklers, mas que não funcionaram no momento do incêndio porque não havia água disponível no sistema. “Além de ter sprinklers instalados, é preciso adotar uma fiscalização regular dos sistemas de proteção contra incêndio para que eles estejam funcionando corretamente em caso de necessidade”, complementa o diretor do ISB.